Produção de Conteúdo - TV digital e o desastre anunciado

O Estado brasileiro está colocando neste momento 50 milhões de reais no desenvolvimento do chamado Sistema Brasileiro de TV Digital. Os recursos, que por enquanto são muito pequenos, vêm do Funttel – Fundo Para o Desenvolvimento Tecnológico das Comunicações. O objetivo, em resumo, é compor um modelo próprio de TV digital que evite parte dos royalties que seriam pagos aos japoneses e europeus pelo uso do MPEG-2 e, no caso pela opção do sistema americano, os royalties que iriam também para a Dolby. O valor desses royalties oscila entre 5 dólares a 20 dólares por televisor.

O país tem 54 milhões de aparelhos receptores de TV instalados, para os quais se planejam transcodificadores (os set-top boxes) que supostamente lhes dariam capacidade digital. O problema é que não dão. Os transcodificadores permitem apenas que sinais digitais sejam convertidos para os aparelhos existentes, mas não os transformam em aparelhos digitais. A verdade é que, com a chegada das plataformas digitais, o parque instalado de aparelhos de TV será substituído.

Cada brasileiro, hoje, mantém seu aparelho de TV por quatro anos. É até muito tempo se comparado ao celular, que descarta a cada 18 meses. Há algo de profundamente estranho, então, em se investir pesadamente sobre um paliativo de curtíssima duração.

TV pelo celular

Muito mais estranho é observar que, enquanto isso acontece, o país escolhe, por decisão política, não investir 1 centavo em pesquisa de conteúdo para as plataformas digitais. Este conteúdo, que os brasileiros poderiam estar pesquisando, não apenas vai permanecer por muitas décadas como poderia render ao país um volume de royalties perto dos quais os 20 dólares por televisor seriam menos do que a gorjeta.

Em várias esferas há, neste momento, uma grande perplexidade em função do desenvolvimento de meios eletrônicos de distribuição de conteúdo audiovisual. A rapidez desse desenvolvimento superou as melhores previsões. Ela está fazendo com que as preocupações com a incessante chegada de tecnologias se distribuam em três níveis: o da conceituação do que venha a ser toda a mídia que está sendo criada; o da sua exploração (onde se inclui o desenvolvimento de modelos de conteúdo); e o da sua regulação.

Tenta-se identificar, por exemplo, se a internet é um serviço de telecomunicações ou um serviço de valor agregado; se a telefonia móvel é ela mesma (como originalmente) um serviço de telecomunicações ou se, como acontece hoje na prática, um serviço de distribuição eletrônica de conteúdo audiovisual, portanto radiodifusão. E isso não é nem o começo.

Hoje, pouca gente compra um telefone celular pensando apenas em utilizá-lo como telefone. Era o oposto há apenas dois anos. Atualmente, o desenvolvimento das aptidões técnicas da telefonia móvel está se dando harmoniosamente com o de seus conteúdos. Não há qualquer dúvida que, nos próximos dois anos, vai-se assistir televisão pelo celular. Sabe-se, no entanto, que não será o Domingão do Faustão, pelo menos não na forma com que o programa vem empacotado aos domingos pela TV aberta. Para a indústria de conteúdo para telefonia móvel, os protocolos e outras características técnicas são o que deveriam ser: ferramentas que lhes permitam construir o que o consumidor está disposto a comprar.

Mau serviço

A próxima bola da vez será a TV digital. Ao decidir, conscientemente, que não cabe investimento na pesquisa de conteúdo, mas apenas no desenvolvimento de tecnologias de conversão de sinais, o governo brasileiro está fazendo três coisas extraordinárias: 1) colocando o dinheiro do contribuinte na construção de caminhos a serem explorados pela iniciativa privada; 2) deixando nas mãos da televisão brasileira, tal como ela é hoje, a prerrogativa de construir também o cenário da televisão digital; e 3) desestimulando (para não usar o termo impedindo) os pesquisadores de conteúdo, seja na área acadêmica ou na pequena empresa, a criarem modelos originais, autênticos, possivelmente inovadores e seguramente brasileiros de formatos digitais. Pois são justamente esses modelos que poderiam inverter a direção do tráfego de exportação/importação de formatos atualmente vigente na televisão brasileira.

No que tange à regulação, deve-se admitir que o Estado debate-se hoje entre a necessidade de regular o que historicamente carece de regulação, a utopia de regular o que é na sua essência irregulável, e a pressão de setores já estabelecidos do chamado "setor produtivo" para que a regulação do audiovisual continue atendo-se apenas ao cinema, como vem acontecendo desde a metade do século passado.

A regulação do que existe e a construção do que virá a existir pertencem a esferas diferentes, mas deveriam ser faces distintas de um mesmo projeto de governo. Para que este cenário seja entendido, é necessário reconhecer que a televisão aberta brasileira não goza do equilíbrio encontrado em mercados nos quais ela potencialmente se espelhou – como o americano, por exemplo. A começar pelo fato de que, lá, as redes de TV são na verdade grandes corporações, que hoje fazem parte de megaconglomerados, com a pulverização de decisões e a exigência de resultados que tal quadro impõe. Esse cenário acabou por gerar uma divisão relativamente equânime tanto do mercado quanto da receita publicitária – as três maiores redes dos EUA operam cada uma com cerca de 12% do bolo publicitário.

No Brasil, as emissoras de televisão continuam sendo empresas com um perfil bem diferente, nas quais a resposta aos acionistas equivale muitas vezes ao atendimento às vontades do patrão. É relevante o fato de que várias delas não dependem dos seus resultados para subsistir. Por isso, algumas são capazes de operar com menos de 2% do mercado. Não estão prestando um bom serviço à geração de riquezas na sua área. E a julgar pelo produto que entregam ao espectador, estão prestando um serviço pior ainda à sociedade brasileira. Não parece uma sábia decisão do governo tomar dinheiro do contribuinte para deixá-las desenhar o modelo da televisão digital para o país.

Índice de nacionalização

A divisão mais eqüitativa do mercado nos EUA, se comparado ao brasileiro, reflete-se também em ideários distintos da própria televisão. As grandes redes americanas são unidas de maneira mais sólida que as brasileiras. Isso ficou explicitado, aqui, com o surgimento de associações de emissoras de televisão concorrentes da Abert – que, na visão das demais emissoras, representa hegemonicamente os interesses da Rede Globo.

O que essa divisão retrata com clareza, também, é a diferença pouco sutil com que uma e outra vertente olham para a sociedade e para os compromissos que pretendem assumir com ela – sejam obrigadas a fazer tal coisa ou não. Por isso, é irônico que a Globo veja-se premida com freqüência a cair na defesa de emissoras que burlam o que ela própria muitas vezes está cumprindo.

Isso pode se referir em parte ao artigo 221 da Constituição brasileira, mas de forma bem mais ampla diz respeito ao compromisso com o tipo de produto que a televisão julga adequado entregar ao espectador. Se tirarmos o foco da própria Globo – que passou a ser percebida pela população brasileira como sinônimo de televisão, tal como Gillete é sinônimo de lâmina de barbear –, o que a televisão brasileira vem construindo e entregando ao espectador, na grande maioria dos casos, é afrontoso à inteligência do cidadão brasileiro e à auto-estima da sociedade. E é também um mau negócio, porque não se pode acreditar que um empresário sinta-se feliz com menos de 2% do mercado.

No ano passado, o maior comprador de conteúdo estrangeiro entre as emissoras brasileiras foi também a que mais perdeu audiência: o SBT teve perdas de 50 milhões de dólares, mas seria um erro focar a discussão simplesmente na quantidade de produto audiovisual importado. O índice de nacionalização é relativamente alto em todas as emissoras, porque o lixo cultural não tem nacionalidade.

Desastre anunciado

A preocupação com a chegada da Telmex entre os acionistas principais da NET e a tramitação do projeto de lei 175/2001, que admite participação majoritária de capital estrangeiro nas operadoras de TV por assinatura, é um grão de areia no deserto que representa a construção de conteúdo brasileiro de qualidade para os meios de difusão no Brasil – sejam eles serviços de comunicação eletrônica de massa, de telecomunicações ou de valor agregado.

O único denominador comum entre os segmentos que preconizam diversas intensidades do papel do Estado nisso tudo é que cabe ao Estado, no mínimo, incentivar a produção desse conteúdo. Mas se há barreiras a tal incentivo, cabe ao Estado também quebrar essas barreiras. Foi o Estado que, por omissão, permitiu que uma grande parte da televisão brasileira usasse a prerrogativa de deter o monopólio da produção audiovisual (que a sociedade jamais lhe concedeu) e despejasse sobre esta mesma sociedade uma programação emburrecedora, vulgar e ainda por cima ineficiente do ponto de vista comercial.

Foi também o Estado que estimulou um quadro de TV por assinatura por onde transitam mais de 300 canais estrangeiros e não dá fôlego para que a sociedade crie uma só programadora brasileira independente. Isto, além de fazer com que a decorrente estagnação do mercado conseguisse o milagre de colocar em dificuldades comerciais o que há de mais eficiente e lucrativo nas operações de TV aberta do país, como avalista e refém de um modelo desastrado de TV por assinatura.

Ao focar exclusivamente sobre o desenvolvimento de tecnologias de conversão de sinais, o governo corre o sério risco de colocar o Brasil na retaguarda da construção de modelos de conteúdo para a televisão digital. Delega essa tarefa para os agentes de um modelo que deixou a televisão brasileira do jeito que está. Abre mão da possibilidade de criar formatos potencialmente globalizantes, portanto grandes geradores de divisas. Determina que as imagens e a força criadora brasileiras para modelos e formatos audiovisuais sejam restritivos e não inclusivos. Descarta uma oportunidade que está brilhando como néon à sua frente.

A sociedade brasileira levará alguns anos para perceber isso. E muitas décadas para pagar pelo erro.

Informação: Sulrádio/ Observatório da Imprensa


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